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domingo, 11 de novembro de 2012

Domingo é isso

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        Domingo no meu caso é assim: desânimo pré segunda-feira, leitura aleatória, filme e chocolate. Hoje estava revendo o filme "The Romantics" (no Brasil: O Casamento do Meu Ex), que por sinal tem final que deixa a desejar, pois é tudo muito subjetivo, nos deixa sem saber como realmente fica a situação dos personagens, porém cita uma parte de um famoso poema que vale a pena a reflexão de domingo. O poema é "Ode a um Rouxinol" de John Keats.


ODE A UM ROUXINOL

Meu peito dói; um sono insano sobre mim 
Pesa, como se eu me tivesse intoxicado  
De ópio ou veneno que eu sorvesse até o fim, 
Há um só minuto, e após no Letes me abismado: 
Não é porque eu aspire ao dom de tua sorte, 
É do excesso de ser que aspiro em tua paz – 
Quando, Dríade leve-alada em meio à flora, 
Do harmonioso recorte 
Das verdes árvores e sombras estivais, 
Lanças ao ar a tua dádiva sonora.


II 
Ah! um gole de vinho refrescado longamente 
Na solidão do solo muito além do chão, 
Sabendo a flor, a seiva verde e a relva quente, 
Dança e Provença e sol queimando na canção! 
Ah! uma taça de luz do Sul, plena e solar, 
Da fonte de Hipocrene enrubescida e pura, 
Com bolhas de rubis à beira rebordada

Nos lábios a brilhar, 
Para eu saciar a sede até chegar ao nada 
E contigo fugir para a floresta escura.


III 
Fugir e dissolver-me, enfim, para esquecer 
O que das folhas não aprenderás jamais: 
A febre, o desengano e a pena de viver 
Aqui, onde os mortais lamentam os mortais; 
Onde o tremor move os cabelos já sem cor 
E o jovem pálido e espectral se vê finar, 
Onde pensar é já uma antevisão sombria 
Da olhipesada dor, 
Onde o Belo não pode erguer a luz do olhar 
E o Amor estremecer por ele mais que um dia.


IV 
Adeus! Adeus! Eu sigo em breve a tua via, 
Não em carro de Baco e guarda de leopardos, 
Antes, nas asas invisíveis da Poesia, 
Vencendo a hesitação da mente e os seus retardos; 
Já estou contigo! suave é a noite linda, 
Logo a Rainha-Lua sobe ao trono e luz 
Com a legião de suas Fadas estelares, 
Mas aqui não há luz, 
Salvo a que o céu por entre as brisas brinda
Em meio à sombra verde e ao musgo dos lugares. 


V 
Não posso ver as flores a meus pés se abrindo, 
Nem o suave olor que desce das ramagens, 
Mas no escuro odoroso eu sinto defluindo 
Cada aroma que incensa as árvores selvagens, 
A impregnar a grama e o bosque verde-gaio, 
O alvo espinheiro e a madressilva dos pastores, 
Violetas a viver sua breve estação; 
E a princesa de maio, 
A rosa-almíscar orvalhada de licores 
Ao múrmuro zumbir das moscas do verão. 


VI 
Às escuras escuto; em mais de um dia adverso 
Me enamorei, de meio-amor, da Morte calma, 
Pedi-lhe docemente em meditado verso 
Que dissolvesse no ar meu corpo e minha alma. 
Agora, mais que nunca, é válido morrer, 
Cessar, à meia-noite, sem nenhum ruído, 
Enquanto exalas pelo ar tua alma plena 
No êxtase do ser! 
Teu som, enfim, se apagaria em meu ouvido 
Para o teu réquiem transmudado em relva amena.


VII 
Tu não nasceste para a morte, ave imortal! 
Não te pisaram pés de ávidas gerações; 
A voz que ouço cantar neste momento é igual 
À que outrora encantou príncipes e aldeões: 
Talvez a mesma voz com que foi consolado 
O coração de Rute, quando, em meio ao pranto, 
Ela colhia em terra alheia o alheio trigo; 
Quem sabe o mesmo canto 
Que abriu janelas encantandas ao perigo 
Dos mares maus, em longes solos, desolado. 

VIII 
Desolado! a palavra soa como um dobre, 
Tangendo-me de ti de volta à solidão! 
Adeus! A fantasia é véu que não encobre 
Tanto como se diz, duende da ilusão. 
Adeus! Adeus! Teu salmo agora tristemente 
Vai-se perder no campo, e além, no rio silente, 
Nas faldas da montanha, até ser sepultado 
Sob o vale deserto: 
Foi só uma visão ou um sonho acordado? 
A música se foi – durmo ou estou desperto?